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Por que raros são os psicólogos superdotados

por Redação CPAH

Por Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues

A psicologia, enquanto campo de estudo e atuação, nasceu com o objetivo de compreender o comportamento humano em suas manifestações mais diversas. No entanto, paradoxalmente, a estrutura de formação tradicional da Psicologia tende a repelir, e não a acolher, indivíduos superdotados. Dito de outro modo: raros são os psicólogos verdadeiramente superdotados não por falta de interesse pela mente, mas pelas limitações epistemológicas da própria formação.

A superdotação, sobretudo quando de natureza intelectual, exige um ambiente que promova abstração elevada, raciocínio divergente, estímulo à interdisciplinaridade e liberdade criativa. A graduação em Psicologia, ao contrário disso, se ancora em pilares de normatividade, repetição conceitual e validação histórica de modelos generalistas. A consequência é uma dissonância: um sistema que forma bons técnicos em comportamento humano, mas que afasta os cérebros mais complexos que poderiam reformular seus próprios paradigmas.

O primeiro obstáculo encontra-se no viés normativo e clínico-patologizante da formação. A maioria dos cursos ainda opera com base em manuais diagnósticos, tipologias comportamentais e constructos populacionais médios. O superdotado, por definição, não está na média. Ele é a exceção estatística que pensa em sistemas, não em categorias fixas. Ao ser forçado a memorizar classificações que não refletem sua própria estrutura mental, esse indivíduo é submetido a um processo de autossabotagem cognitiva.

O segundo fator é metodológico. A pedagogia da psicologia é linear e pouco plástica, ou seria neuroplástica? Estimula a repetição, a fidelidade aos autores e a aceitação de teorias consagradas. Para o superdotado, que possui hiperconectividade entre áreas corticais e um impulso neurobiológico por explorar hipóteses, essa estrutura é limitante. Sem espaço para transgressão criativa ou para propor modelos alternativos, como o exemplo da própria Inteligência DWRI, que desenvolvi com base em mapeamentos funcionais cerebrais e integração genômica, muitos abandonam o curso ou se tornam subversivos silenciosos dentro da profissão.

Não apenas isso, há um preconceito implícito contra o intelecto elevado dentro de parte da psicologia acadêmica. Confunde-se QI alto com soberba, e pensamento crítico com arrogância. Isso gera um paradoxo: uma ciência voltada ao humano que recusa aquilo que mais caracteriza a mente humana em sua plenitude, a capacidade de transcender padrões. É por isso que grande parte dos psicólogos superdotados que conheço foram formados fora do circuito tradicional, ou migraram para áreas híbridas como neurociência, filosofia da mente ou inteligência artificial. E, teria que fazer um estudo sobre isso, mais a maioria dos poucos que conheço, superdotados e psicólogos, são autistas. Deve ser porque a combinação entre superdotação e autismo, especialmente no espectro leve, favorece a hiperfocalização analítica, a busca por padrões humanos e a necessidade de entender o comportamento como forma de compensar dificuldades de interação social, o que os atrai naturalmente à psicologia.

Outro ponto negligenciado é o impacto da hipersensibilidade emocional e social, frequentemente associada à superdotação. A vivência universitária, com sua competição informal, validações de grupo e exigência de conformismo, pode ser hostil ao perfil sensível e analítico do superdotado. Essa incompatibilidade entre cognição avançada e ambiente de baixa densidade intelectual afasta talentos que poderiam revolucionar a psicologia contemporânea.

Por fim, a própria epistemologia do campo ainda engatinha na integração com áreas de fronteira como genômica, neurobiologia, epigenética e inteligência artificial. É nesta convergência que se encontra o futuro da compreensão mental, e é neste território que o superdotado naturalmente se instala. Quando a psicologia negligencia esse movimento, ela automaticamente marginaliza seus potenciais pensadores mais avançados.

Portanto, os psicólogos superdotados são raros não por falta de vocação, mas porque o caminho até a realização profissional nessa área é tortuoso, desajustado ao seu funcionamento cerebral. E enquanto a psicologia continuar a operar como um sistema fechado, baseado em médias e protocolos fixos, continuará afastando aqueles que pensam fora do espectro normativo, justamente os que têm maior potencial para transformá-la.

A psicologia precisa urgentemente se abrir à exceção, à complexidade, à genialidade. Não como algo a ser tratado, mas como algo a ser compreendido e integrado. Somente assim, poderá ser uma ciência verdadeiramente humana, em todas as suas possibilidades.

Alguns destaques

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