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O que é ser normal?

por Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues

Por: Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues – Pós-PhD em Neurociências, Especialista em Genômica Comportamental e Inteligência

Ao longo da história, o conceito de “normal” tem sido moldado por convenções sociais e métricas estatísticas. No entanto, a neurociência confronta esse termo com um dado incômodo: estimativas epidemiológicas sugerem que cerca de 30% a 50% da população mundial pode apresentar, ao longo da vida, algum transtorno mental diagnosticável. Esse percentual cresce quando incluímos condições subclínicas e transtornos de personalidade, em especial os do cluster B, como narcisista, histriônico e borderline que, pela própria natureza, têm baixa taxa de autorreconhecimento e procura por diagnóstico.

Se considerarmos que esses indivíduos raramente chegam à avaliação profissional, o retrato epidemiológico se distorce ainda mais. A pergunta, portanto, é inevitável: em um cenário onde quase metade da população poderia preencher critérios para algum transtorno, qual seria o padrão para chamar alguém de “normal”?

Na lógica científica, “normal” deve ser definido por um denominador comum verificável. Assim como, na botânica, uma oliveira é reconhecida por um conjunto estável de características morfológicas e funcionais que se repetem independentemente de variações menores, na psiquiatria e psicologia o processo é similar. Critérios diagnósticos operam com limiares numéricos claros: para muitos transtornos de personalidade descritos no DSM-5, por exemplo, considera-se diagnóstico quando o indivíduo apresenta pelo menos 5 de um total de 9 traços específicos, cerca de 55% dos critérios estabelecidos, desde que tais traços sejam persistentes, inflexíveis e presentes em múltiplos contextos. Essa proporção não é arbitrária; deriva de análises de sensibilidade e especificidade que demonstram que, a partir desse ponto, a probabilidade de se tratar de uma condição clinicamente relevante ultrapassa 80% quando avaliada por profissional treinado.

Assim, existe um padrão mensurável, literal e matemático. O “normal” corresponderia à ausência desses padrões patológicos, preservando a coerência adaptativa da cognição e do comportamento. Neurobiologicamente, essa coerência está vinculada à integridade funcional do córtex pré-frontal dorsolateral (raciocínio lógico), do córtex cingulado anterior (resolução de conflitos e controle atencional) e da junção temporoparietal (integração social e contextual).

Alterações estruturais ou funcionais nessas áreas são recorrentes em estudos de neuroimagem em indivíduos com transtornos mentais, refletindo maior propensão a decisões ilógicas ou desadaptativas. Por consequência, pode-se sustentar que o “normal” seria aquele que preserva maior consistência lógica e racional diante das circunstâncias, não no sentido de frieza, mas na capacidade de interpretar, ponderar e agir com base em evidências internas e externas, moduladas por equilíbrio emocional.

Definir “normalidade” por essa perspectiva desloca o conceito da opinião para a métrica neurocognitiva, permitindo reduzir a subjetividade e aumentar a precisão. Afinal, ciência não é sobre confortar crenças, mas sobre estabelecer parâmetros verificáveis que sustentem diagnósticos e prevenções eficazes.

Logo, dentro dessa lógica, o “normal” corresponderia ao indivíduo que preserva elevada capacidade de raciocínio lógico, análise crítica e coerência diante das circunstâncias, aliada a um sistema emocional funcional. Não se trata de ausência de emoção, mas da habilidade de integrá-la ao processo decisório sem permitir que ela se sobreponha de forma desproporcional à razão, mantendo o equilíbrio entre resposta afetiva e julgamento racional, sustentado por circuitos pré-frontais e límbicos em funcionamento harmônico.

Referências
KESSLER, R. C. et al. Lifetime prevalence and age-of-onset distributions of DSM-IV disorders in the National Comorbidity Survey Replication. Archives of General Psychiatry, v. 62, n. 6, p. 593–602, 2005. DOI: 10.1001/archpsyc.62.6.593.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. World Mental Health Report: Transforming Mental Health for All. Geneva: WHO, 2022.

Biografia
Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues MRSB/P0149176 é Pós-PhD em Neurociências, eleito membro da Sigma Xi – The Scientific Research Honor Society (mais de 200 membros da Sigma Xi já receberam o Prêmio Nobel), além de ser membro da Society for Neuroscience nos Estados Unidos, da Royal Society of Biology e da The Royal Society of Medicine no Reino Unido, da The European Society of Human Genetics em Vienna, Austria e da APA – American Philosophical Association nos Estados Unidos. Mestre em Psicologia, Licenciado em História e Biologia, também é Tecnólogo em Antropologia e Filosofia, com diversas formações nacionais e internacionais em Neurociências e Neuropsicologia. Dr. Fabiano é membro de prestigiadas sociedades de alto QI, incluindo Mensa International, Intertel, ISPE High IQ Society, Triple Nine Society, ISI-Society e HELLIQ Society High IQ. Ele é autor de mais de 330 estudos científicos e 30 livros. Atualmente, é professor convidado na PUCRS e Comportalmente no Brasil, UNIFRANZ na Bolívia e Santander no México. Além disso, atua como Diretor do CPAH – Centro de Pesquisa e Análises Heráclito e é o criador do projeto GIP, que estima o QI por meio da análise da inteligência genética.

Dr. Fabiano também possui registro de jornalista, tendo seu nome incluído no livro dos registros de recordes por conquistar quatro recordes, sendo um deles por ser o maior criador de personagens na história da imprensa.

Alguns destaques

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