A empatia é um fenômeno multifacetado que permite ao indivíduo compreender e compartilhar os estados emocionais de outrem, sendo crucial para a coesão social e os comportamentos prosociais. No estudo conduzido por Plata-Bello et al. (2023), buscou-se investigar como o nível de empatia de um indivíduo modula a atividade do sistema neuronal de espelho sensoriomotor (MNS) durante a observação de expressões faciais de dor. A pesquisa empregou imagens de ressonância magnética funcional (fMRI) em repouso e em tarefa, aliadas ao uso do Interpersonal Reactivity Index (IRI), um instrumento que mensura diferentes componentes da empatia.
O estudo revelou que a observação de expressões de dor ativa significativamente regiões do córtex parietal, frontal e temporal, com ênfase na atividade no giro parietal inferior esquerdo (IPL). Essa área é considerada um dos núcleos do MNS sensoriomotor, cuja função tradicionalmente associada é a codificação de ações motoras observadas. No entanto, os resultados evidenciaram que tal atividade está positivamente correlacionada com os escores da subescala “empatic concern” (preocupação empática) do IRI, indicando que essa ativação não se limita à codificação motora, mas está diretamente relacionada à capacidade empática do observador.
Essa associação entre empatia e MNS foi reforçada por análises de conectividade funcional em repouso. Verificou-se um aumento na conectividade entre os IPLs bilaterais e áreas do córtex pré-frontal superior, incluindo o giro frontal inferior direito, também componente do MNS. Essa conectividade funcional aumentada pode ser interpretada como uma base neural para a capacidade de simular internamente a experiência dolorosa alheia, o que corrobora modelos teóricos que postulam a empatia como um processo de simulação incorporada. Interessantemente, a conectividade do giro frontal inferior esquerdo com regiões como o giro temporal médio direito e a área motora suplementar também foi modulada pelos níveis de preocupação empática, sugerindo uma rede empático-motora mais ampla.
É notável que os efeitos observados foram lateralizados predominantemente para o hemisfério esquerdo. Considerando que todos os participantes eram destros, isso corrobora achados anteriores que indicam uma dominância hemisférica esquerda em tarefas que envolvem simulação motora e representação sensorial de estados emocionais, como a dor. Tal assimetria hemisférica pode refletir uma especialização funcional na codificação e simulação da dor alheia em indivíduos com maior preocupação empática.
Os autores também destacaram que, embora o MNS seja frequentemente dividido em componentes sensoriomotor e emocional, ambos interagem estruturalmente e funcionalmente. A ativação do MNS sensoriomotor durante a observação de dor sugere que processos tradicionalmente afetivos (como a empatia) podem recrutar regiões classicamente motoras, especialmente em contextos sociais com forte carga emocional. Isso fortalece a ideia de que a empatia não é meramente uma resposta afetiva passiva, mas envolve simulações neurais ativas que engajam redes motoras e perceptivas complexas.
Conclui-se que a empatia, particularmente a preocupação empática, é um modulador chave da atividade do sistema de neurônios-espelho sensoriomotor. Essa descoberta tem implicações importantes para o entendimento da base neural da empatia em contextos clínicos, como no cuidado de pacientes em sofrimento. A identificação de redes neurais moduladas por características empáticas individuais pode abrir caminho para intervenções personalizadas visando aprimorar a resposta empática, especialmente em profissionais da saúde.
Referência:
PLATA-BELLO, Julio et al. Empathy modulates the activity of the sensorimotor mirror neuron system during pain observation. Behavioral Sciences, v. 13, n. 11, p. 947, 2023. DOI: https://doi.org/10.3390/bs13110947.