O agrupamento Euclid, que integra diversos estudiosos do Centro de Astrofísica e Estudos do Espaço, divulgou recentemente uma ampla variedade de achados académicos. Com apenas 0,45% da prospeção prevista da missão orbital Euclid (ESA) realizada, o Coletivo Euclid, do qual participam vários peritos do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) na Universidade do Porto, obteve numerosos resultados relevantes. Estes estão descritos em 34 manuscritos técnicos que acabam de ser disponibilizados e que abrangem, por exemplo, a deteção de fenómenos de lente gravitacional, a análise de aglomerados estelares e da rede cósmica, a descrição de centros galácticos ativos (AGN) e quasares, investigações sobre a evolução e estrutura das galáxias, assim como a localização de várias galáxias anãs e objetos transitórios.
Após uma primeira divulgação de conclusões e informação preliminar, em maio de 2024, a evolução do Coletivo é agora evidenciada por meio de um segundo conjunto de relatórios do Euclid, baseados em novos registos intitulados “Quick release 1” (Q1), onde foram identificados 30 milhões de corpos celestes. Estes ilustram o que será amplamente examinado pelos analistas do Coletivo Euclid, para traçar o mapa da composição em larga escala do Cosmos ao longo do tempo e aprofundar a essência da matéria invisível e da energia obscura nos próximos períodos.
Através de métodos avançados de computação inteligente, os estudiosos do IA têm-se dedicado à deteção e catalogação de diferentes categorias de galáxias captadas pelo Euclid. Entre estas, salientam-se galáxias inativas (que já não geram estrelas), núcleos ativos (com buracos negros supermassivos no seu núcleo) e galáxias com efeito de lente gravitacional (cuja radiação é desviada por outros corpos massivos, funcionando como uma lente natural). A massa de informação que está a ser adquirida com o observatório Euclid não só abre caminho a novos progressos académicos, como impõe desafios tecnológicos.
“Numa comunidade em constante transformação, onde a computação avançada é cada vez mais referida, também na astronomia procuramos tirar pleno proveito destes métodos. Seja para tratamento de imagens e espectros, ou interpretação de dados, o que temos verificado nos últimos quatro anos é que as ferramentas que desenvolvemos serão a base de muitas futuras revelações”, afirma Pedro Cunha, estudioso do IA e da Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP).
Outro contributo relevante dos especialistas do IA neste agrupamento tem sido na validação das medições obtidas, no que diz respeito às formas e dimensões das galáxias estudadas durante a Q1. Estes registos têm grande valor, auxiliando astrónomos a compreender como as galáxias se alteraram ao longo do tempo.
“Nos próximos períodos, a equipa do IA irá concentrar-se na análise das galáxias que ainda produzem estrelas. Para isso, vão avaliar a linha de emissão H-alfa, uma marca de radiação muito particular que revela a presença de zonas onde novas estrelas estão a surgir. Além disso, o grupo irá também observar o meio em torno de cada galáxia e como a proximidade de outras galáxias ou conjuntos galácticos pode influenciar a sua transformação”, adianta a investigadora Ana Afonso, do IA/U.Porto. A estrutura e metamorfose das galáxias são centrais para a pesquisa de legado do Euclid. Em agosto de 2024, integrantes do Agrupamento lançaram uma iniciativa de ciência colaborativa na plataforma Zooniverse, envolvendo milhares de voluntários para treinar um algoritmo de aprendizagem profunda na classificação de formas galácticas. O registo resultante, baseado nos primeiros 0,45% do vasto conjunto de galáxias que o Euclid irá captar em detalhe, já se revelou útil para os estudiosos.
“Embora seja um primeiro vislumbre do levantamento integral, estes 0,45% são já a maior área contínua do firmamento jamais observada com um equipamento espacial no espectro ótico/infravermelho próximo”, refere Ismael Tereno, investigador do IA e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (CIÊNCIAS ULisboa), coordenador da equipa do Agrupamento Euclid de apoio às operações de rastreio. Esta equipa, que conta com apoio financeiro da Agência Espacial Portuguesa, é a responsável pelo desenho do plano de observações.
“Produzir registos de alta fidelidade para a comunidade científica internacional requer um grande esforço de processamento que exige um elevado número de algoritmos complexos para converter as imagens brutas em dados utilizáveis”, acrescenta Ismael Tereno, que é coautor do artigo que oferece uma perspetiva global dos dados e conclusões agora tornados públicos.
Polychronis Papaderos, estudioso do IA/U.Porto, acredita que “estes registos de alta precisão servirão como base para uma pesquisa sem precedentes, da cronologia de formação das galáxias e da influência dos núcleos ativos na modificação galáctica”.
“Com estes propósitos académicos em mente, e como parte integrante do esforço coordenado do IA, desde a sua fundação em 2014, os nossos investigadores desenvolveram aplicações avançadas para examinar imagens e espectros de galáxias. Estas ferramentas digitais incluem algoritmos de aprendizagem automática (machine learning), que estão a ser aplicados amplamente aos registos do Euclid”, conclui também o líder do grupo “A cronologia da formação de galáxias analisada no espaço e no tempo” do IA.
Relativamente ao impacto destes avanços, António da Silva (IA & CIÊNCIAS ULisboa), representante nacional da Direção do Agrupamento Euclid e elo de contacto da missão junto da Agência Espacial Portuguesa, refere que “atualmente, o grupo de Cosmologia do IA atua ativamente na preparação de testes cosmológicos que irão utilizar os dados recolhidos pelo Euclid para avaliar modelos cosmológicos com energia escura dinâmica ou alterações à gravidade de Einstein. Além disso, o grupo explora modelos que permitem desvios à homogeneidade e isotropia, princípios fundamentais do modelo cosmológico padrão, bem como modelos alternativos que admitem a possibilidade de variação das constantes fundamentais ao longo da cronologia do Universo”. No entanto, estas linhas de estudo ainda requerem mais registos e terão de aguardar pela continuação da prospeção Euclid.

