Um estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, conduzido por um grupo de cientistas da Universidade de Nova Iorque, quase quatro décadas após o maior desastre nuclear do mundo, revelou resultados surpreendentes: uma coleção de vermes microscópicos que habitavam a Zona de Exclusão de Chernobyl, submetidos a análises laboratoriais, demonstraram resistência aos efeitos da radiação.
Após o desastroso colapso em 26 de abril de 1986 na central nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, a região mais afetada foi declarada uma área de acesso proibido – a Zona de Exclusão de Chernobyl. Esta área, de quase 2.700 quilômetros quadrados em torno de um raio de 30 km da central, tornou-se um dos lugares mais radioativos do mundo: liberou 400 vezes mais radiação na atmosfera do que a bomba lançada sobre Hiroshima.
O grupo de cientistas visitou a Zona de Exclusão de Chernobyl em 2019 com o objetivo de coletar vermes microscópicos da espécie Oscheius tipulae, que viveram em áreas com alta e baixa radiação. A partir de sua análise, concluíram que o conjunto completo de genes que compõem o organismo dos vermes não foi afetado, apesar da exposição à radiação. De fato, os nematoides – pequenos vermes – estão conseguindo se desenvolver apesar dos níveis extremos de radiação.
Segundo os pesquisadores, a resiliência dos vermes desafia as previsões anteriores sobre os impactos da radiação em organismos e abre caminho para futuros estudos sobre mecanismos de reparo de DNA e adaptação a ambientes hostis.
Os cientistas sequenciaram o genoma de 15 nematoides da Zona de Exclusão de Chernobyl que foram expostos a diferentes níveis de radiação e os compararam com cinco de outras partes do mundo. Os resultados mostram que não foram encontrados sinais de danos por radiação nos vermes da Zona de Exclusão, ao contrário de estudos realizados em outros animais, como sapos, que sofreram alterações físicas após a exposição à radiação de Chernobyl. Essa descoberta sugere que esses organismos possuem mecanismos de reparo de DNA altamente eficientes que lhes permitem sobreviver em ambientes extremamente radioativos.
Ao obter esses resultados, os pesquisadores questionaram se este seria simplesmente o caso dos nematoides por serem particularmente habilidosos na reparação de seu DNA. Para obter uma resposta a essa pergunta, estimularam a reprodução de 20 vermes em ambiente de laboratório e testaram a exposição de seus descendentes a produtos químicos que danificam o DNA. As diferentes linhagens mostraram divergências na forma como resistiam à mutação do DNA em face dos produtos químicos, mas os pesquisadores não estabeleceram correlação entre a resistência aos danos no DNA e os níveis de radiação aos quais seus antepassados foram expostos.
Os resultados sugerem que os vermes de Chernobyl não são “necessariamente mais tolerantes à radiação e a paisagem radioativa não os forçou a evoluir”. No entanto, os cientistas acreditam que este estudo pode ser um grande avanço na ciência e fornecer informações para a pesquisa do câncer em seres humanos.
A principal autora do estudo, Sophia Tintori, afirmou: “Não sabemos quanto tempo cada um dos vermes que coletamos permaneceu na Zona, então não podemos ter certeza do nível de exposição que cada verme e seus ancestrais receberam nas últimas quatro décadas”. E acrescentou a seguinte explicação: “Isso não significa que Chernobyl seja seguro – é mais provável que signifique que os nematoides são animais realmente resistentes e podem sobreviver a condições extremas”.