Os transtornos de humor, incluindo o Transtorno Bipolar (TB) e o Transtorno Depressivo Maior (TDM), são altamente prevalentes na adolescência. Contudo, a sobreposição de sintomas depressivos representa um desafio clínico significativo, resultando em uma taxa de misdiagnóstico de TB como TDM de aproximadamente 50% a 75%. Este erro diagnóstico é grave, pois o tratamento inadequado com antidepressivos em pacientes com TB pode induzir episódios maníacos ou hipomaníacos, piorar o prognóstico clínico e funcional e aumentar o risco de suicídio.
Uma análise bibliométrica e visual recente (Yang et al., 2023) explorou as tendências e os pontos focais da pesquisa global sobre a diferenciação diagnóstica entre TB e TDM em adolescentes, destacando as áreas mais promissoras para a identificação de biomarcadores e características clínicas distintivas.
O Panorama da Pesquisa e os Pontos Focais
A pesquisa sobre a diferenciação entre TB e TDM em adolescentes tem crescido consistentemente desde 2012, sendo os Estados Unidos o principal centro de influência global. A análise de coocorrência de palavras-chave identificou três principais áreas de pesquisa: características clínicas, fatores genéticos e neuroimagem.
Características Clínicas Diferenciadoras
Embora ambos os transtornos compartilhem episódios depressivos, certos traços clínicos são mais sugestivos de TB:
Comorbidades Psiquiátricas: O TB é consistentemente associado a mais comorbidades psiquiátricas do que o TDM, incluindo transtorno de conduta, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno de personalidade borderline.
Sintomas Maníacos Subssindrômicos: Pacientes com depressão bipolar exibem escores significativamente mais altos em sintomas maníacos subssindrômicos, caracterizados por euforia, exaltação verbal, pensamento acelerado e hiperatividade, mesmo quando se apresentam com depressão.
Características Atípicas: As características atípicas, como reatividade de humor e sonolência diurna aumentada (diferente do aumento de apetite ou ganho de peso), têm sido consideradas marcadores mais confiáveis para identificar o TB, embora nem todos os sintomas atípicos sejam úteis para o diagnóstico.
Risco de Suicídio e Autoagressão: Indivíduos com depressão bipolar apresentam taxas significativamente mais altas de suicidalidade e autoagressão física não suicida em comparação com a depressão unipolar.
Histórico Familiar: O TB apresenta uma maior agregação familiar e uma vulnerabilidade genética mais forte do que o TDM, com parentes de primeiro grau de indivíduos com TB I apresentando um risco de 5,96 vezes maior de desenvolver a doença.
Biomarcadores Objetivos e Fatores Biológicos
A necessidade de biomarcadores objetivos e precoces é evidente, pois as características clínicas podem ser imprecisas e sujeitas a viés de memória.
Neuroimagem (Neuroimaging)
O Córtex Cingulado Anterior (ACC) demonstrou um papel crucial na diferenciação.
Conectividade Funcional: A depressão bipolar mostrou conectividade funcional inter-hemisférica aumentada entre as áreas frontais em adolescentes, diferentemente da depressão unipolar.
Metabolismo e ACC: A depressão unipolar apresentou um aumento significativo na razão colina/creatina do ACC (um indicador de alterações na densidade celular ou síntese/degradação de membranas), em comparação com a depressão bipolar.
Atividade em Tarefas: Adolescentes com TB demonstraram maior atividade no ACC em comparação com TDM durante a tarefa NoGo (inibição de resposta).
Fatores Genéticos e Perfil Inflamatório
Risco Poligênico (PRS): O PRS para TB (BD PRS) emergiu como um método promissor para discriminar o TB do TDM em estágios iniciais, pois o BD PRS é mais alto no TB e demonstrou prever a transição da depressão unipolar para o TB.
Inflamação Periférica: Pacientes com TB, mesmo em adolescentes de primeiro episódio, tendem a apresentar um estado pró-inflamatório mais elevado do que aqueles com TDM, com níveis mais altos de citocinas pró-inflamatórias e níveis mais baixos de citocinas anti-inflamatórias (IL-2).
Metabolismo: Pacientes com TB exibiram um metabolismo mais severo, refletido em níveis elevados de glicemia de jejum, ácido úrico e lactato desidrogenase (LDH), o último sugerindo disfunção mitocondrial na patogênese do TB.
Conclusão e Direções Futuras
A identificação de indicadores clínicos e biomarcadores objetivos que diferenciam o TB do TDM em adolescentes é fundamental para reduzir as taxas de misdiagnóstico e melhorar os resultados clínicos. Embora o número de estudos diretos de comparação em adolescentes seja limitado, a pesquisa aponta para a necessidade de construir modelos de diagnóstico multidimensional (usando machine learning) que combinem informações clínicas, neuroimagem (com EEG para melhor resolução temporal) e perfis de multi-ômicas no sangue periférico para aumentar a precisão diagnóstica precoce.
Referência:
YANG, Ruilan et al. Differentiation between bipolar disorder and major depressive disorder in adolescents: from clinical to biological biomarkers. Frontiers in Human Neuroscience, [S. l.], v. 17, n. 1192544, 15 set. 2023. doi:10.3389/fnhum.2023.1192544.

