A investigação das correlações entre capacidades cognitivas superiores e mecanismos sensoriais básicos tem ganhado destaque na neurociência cognitiva. No estudo conduzido por Arranz-Paraiso e Serrano-Pedraza (2018), testou-se de forma sistemática a hipótese de que a supressão visual — especificamente a supressão de movimento e a supressão de contraste espacial — está associada ao quociente de inteligência (QI), com base em evidências anteriores de correlações significativas.
A supressão visual refere-se à dificuldade em discriminar estímulos visuais quando estes estão rodeados por estímulos similares, sendo interpretada como expressão funcional dos mecanismos inibitórios corticais. Estudos anteriores, como Melnick et al. (2013), encontraram uma forte correlação positiva (r = 0,71) entre o índice de supressão de movimento (Motion Suppression Index, MSI) e o QI geral. Cook et al. (2016), utilizando tarefa de pareamento de contraste, reportaram correlação ainda mais robusta (r = 0,87) entre supressão de contraste espacial e inteligência visuoespacial.
No entanto, os achados do presente estudo apontam nuances importantes. Em uma amostra de 50 jovens adultos com visão normal e ausência de sintomas depressivos significativos, duas tarefas psicofísicas foram aplicadas: uma de discriminação de movimento (medindo o MSI) e outra de detecção de contraste (para calcular o Contrast Suppression Index, CSI). Embora os resultados da tarefa de movimento tenham replicado parcialmente os dados anteriores — com correlação positiva entre MSI e QI geral (r = 0,43, p = 0,002) —, a tarefa de contraste não evidenciou qualquer associação significativa com medidas de inteligência (r = -0,09, p = 0,513).
Essa dissociação entre as formas de supressão visual sugere a ativação de mecanismos neurais distintos, ainda que ambos tenham sido atribuídos à modulação inibitória GABAérgica. No caso do MSI, indivíduos com maior QI apresentaram limiares de duração mais baixos para estímulos pequenos (indicando maior velocidade de processamento) e mais altos para estímulos grandes (indicando maior supressão de informações irrelevantes). Já no CSI, a ausência de correlação com QI pode decorrer de diferenças metodológicas cruciais. Enquanto Cook et al. utilizaram tarefas de pareamento de contraste com diversos níveis de excentricidade, Arranz-Paraiso e Serrano-Pedraza empregaram tarefas de detecção de contraste periférico em 5° de excentricidade. Além disso, o pequeno número de participantes (N = 9) em Cook et al. pode ter inflacionado artificialmente a força da correlação relatada.
É relevante destacar que a validade da correlação entre MSI e inteligência já foi contestada por Troche et al. (2018), que, com uma amostra maior (N = 177), não conseguiram replicar o achado (r = -0,01). Contudo, diferenças no equipamento experimental — como o uso de monitores LCD em vez de CRT — e configurações de contraste podem ter comprometido a replicabilidade, uma vez que a supressão de movimento é particularmente sensível a parâmetros visuais finos.
A principal contribuição deste estudo reside na replicação, ainda que com correlação moderada, da ligação entre supressão de movimento e inteligência geral, evidenciando que indivíduos com maior QI possuem maior eficiência inibitória visual. Ao mesmo tempo, os resultados ressaltam a importância de padronizar metodologias psicofísicas e considerar os limites dos testes utilizados ao correlacionar dados sensoriais com constructos cognitivos complexos.
Referência:
ARRANZ-PARAÍSO, Sandra; SERRANO-PEDRAZA, Ignacio. Testing the link between visual suppression and intelligence. PLoS ONE, v. 13, n. 7, p. e0200151, 2018. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0200151.

