Início ColunaNeurociências A hereditariedade da superdotação: Uma análise baseada no Projeto GIP

A hereditariedade da superdotação: Uma análise baseada no Projeto GIP

Este projeto, com uma base de dados composta por mais de 150 indivíduos com QI variando de 110 a 160 pontos, oferecendo valiosa compreensão sobre a transmissão hereditária da superdotação.

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A superdotação, caracterizada por um desempenho excepcional em tarefas cognitivas, tem sido objeto de estudos diversos, especialmente no que tange à hereditariedade desta capacidade. O Projeto GIP (Genetic Intelligence Project), conduzido pelo neurocientista Dr. Fabiano de Abreu Agrela, busca elucidar a influência genética na inteligência humana. Este projeto, com uma base de dados composta por mais de 150 indivíduos com QI variando de 110 a 160 pontos, oferecendo valiosa compreensão sobre a transmissão hereditária da superdotação.

Resultados do Projeto GIP

Os dados coletados pelo Projeto GIP revelam padrões distintos de transmissão de altas habilidades cognitivas:

1. Pais com altas habilidades e filhos superdotados: A maioria dos casos estudados.

2. Pai superdotado e mãe não superdotada com filho(a) com QI maior que o pai: Uma ocorrência significativa.

3. Pai superdotado e mãe não superdotada com filho(a) com QI menor que o pai: Casos também documentados.

4. Pai superdotado e mãe com altas habilidades com filhos superdotados: Todos os casos observados.

5. Mãe e pai superdotados com filhos superdotados: Consistência observada em todos os casos.

6. Ausência de casos de mulheres superdotadas com pais não superdotados: Uma lacuna nos dados que sugere a necessidade de maior amostragem.

A análise destes resultados sugere uma forte componente genética na transmissão da superdotação, particularmente quando ambos os pais apresentam altas habilidades cognitivas. No entanto, a influência ambiental e a interação gene-ambiente não podem ser subestimadas.

Revisão da Literatura Científica

Estudos de associação genômica ampla (GWAS) estabelecem que a inteligência humana é altamente hereditária e poligênica. Uma análise genômica ampla de 3511 adultos não relacionados com dados sobre 549 692 polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs) e fenótipos detalhados em características cognitivas estimou que 40% da variação na inteligência do tipo cristalizado e 51% da variação na inteligência do tipo fluido entre os indivíduos é explicada pelo desequilíbrio de ligação entre marcadores de SNP comuns genotipados e variantes causais desconhecidas. Se a herdabilidade no sentido restrito da inteligência for de ~60% nas faixas etárias estudadas nas amostras do CAGES, então nem toda a variação aditiva é explicada pelas análises. (DAVIES, G. et al., 2011).

A inteligência é um dos traços comportamentais mais herdáveis. A herdabilidade da inteligência aumenta de cerca de 20% na infância para talvez 80% no final da idade adulta. (Plomin and Deary, 2015).

Análises baseadas em pedigree da inteligência relatam que as diferenças genéticas são responsáveis por 50 a 80% da variação fenotípica, enquanto para traços de personalidade, esses efeitos são menores, com 34 a 48% da variação explicada por diferenças genéticas. (Hill et al., 2018).

A herdabilidade da inteligência geral (g) aumenta com a idade, passando de 0,26 aos 7 anos para 0,45 aos 12 anos, evidenciando um aumento na influência genética nessa fase do desenvolvimento. (Trzaskowski et al., 2014).

Em um estudo com 1314 participantes holandeses de 317 famílias, incluindo gêmeos monozigóticos e dizigóticos, seus irmãos, cônjuges e pais ou filhos, Vinkhuyzen et al. (2012) investigaram a influência da seleção de parceiros na herdabilidade da inteligência. Os resultados sugerem que a alta herdabilidade da inteligência em adultos (75% a 85%) pode ser parcialmente atribuída à dominância genética (27%) e à seleção de parceiros com base em fenótipos semelhantes (11%), além da influência de fatores genéticos aditivos (44%) e ambientais não compartilhados (18%).

Os estudos corroboram os achados do Projeto GIP. Por exemplo, Plomin e Deary (2015) relatam que a herdabilidade da inteligência pode chegar a 80% em populações adultas, sugerindo uma contribuição genética substancial (Plomin, R., & Deary, I. J. (2015). Genetics and intelligence differences: five special findings. Molecular Psychiatry, 20(1), 98-108). Por outro lado, a variação fenotípica na inteligência é influenciada por múltiplos loci genéticos, cada um contribuindo de maneira incremental para o QI geral (Davies, G., et al. (2011). Genome-wide association studies establish that human intelligence is highly heritable and polygenic. Molecular Psychiatry, 16(10), 996-1005).

Análise Hipotética de QI

A seguir, apresentamos as estimativas do QI dos filhos em quatro cenários distintos, utilizando uma herdabilidade média de 70% para a inteligência e considerando uma variação padrão de ±15 pontos de QI.

Cenário 1: Pai com 150 e Mãe com 120 de QI

Primeiramente, calculamos a média do QI dos pais, que resulta em 135. Considerando que 70% da inteligência é herdada geneticamente, a contribuição genética seria de 94.5 pontos. A contribuição ambiental, que representa 30% e é baseada na média de QI da população geral (100 pontos), seria de 30 pontos. Assim, o QI esperado do filho seria a soma dessas contribuições, resultando em 124.5. Incluindo a variação natural de ±15 pontos, o intervalo de QI esperado para o filho seria de 109.5 a 139.5.

Cenário 2: Pai com 125 e Mãe com 125 de QI

Neste caso, a média do QI dos pais é 125. Com uma herdabilidade de 70%, a contribuição genética seria de 87.5 pontos, enquanto a contribuição ambiental seria novamente de 30 pontos. Portanto, o QI esperado do filho seria 117.5. Considerando a variação padrão de ±15 pontos, o intervalo de QI esperado seria de 102.5 a 132.5.

Cenário 3: Mãe com 155 e Pai com 130 de QI

Para uma mãe com 155 de QI e um pai com 130 de QI, a média dos QIs dos pais seria 142.5. A contribuição genética, representando 70% dessa média, seria de 99.75 pontos, e a contribuição ambiental seria de 30 pontos. Dessa forma, o QI esperado do filho seria 129.75. Com a variação natural de ±15 pontos, o intervalo de QI esperado seria de 114.75 a 144.75.

Cenário 4: Mãe com 120 e Pai com 115 de QI

Finalmente, para uma mãe com 120 e um pai com 115 de QI, a média dos QIs dos pais seria 117.5. A contribuição genética seria de 82.25 pontos (70% da média), e a contribuição ambiental seria de 30 pontos. O QI esperado do filho, portanto, seria 112.25. Incluindo a variação de ±15 pontos, o intervalo de QI esperado seria de 97.25 a 127.25.

“Sim, a superdotação apresenta uma alta herdabilidade. No entanto, a herdabilidade genética pode variar devido a variantes sentinelas que influenciam significativamente a inteligência. Portanto, essa herdabilidade genética para superdotação não é exata, variando de indivíduo para indivíduo e dependendo de uma combinação aleatória de alelos significativos presentes em um dos pais.”

– Dr. Fabiano de Abreu Agrela

Considerações Finais

Os dados preliminares do Projeto GIP apontam para uma forte influência genética na superdotação, especialmente quando ambos os pais possuem altas habilidades cognitivas. No entanto, para uma compreensão mais abrangente, é necessário expandir a amostragem e considerar a complexidade da interação gene-ambiente. A continuidade deste tipo de pesquisa é crucial para desvendar os mecanismos subjacentes à transmissão hereditária da inteligência e para desenvolver estratégias educacionais e de suporte adequadas para indivíduos superdotados.

Referências

– PLOMIN, R.; DEARY, I. J. Genetics and intelligence differences: five special findings. *Molecular Psychiatry*, v. 20, n. 1, p. 98-108, 2015.

– DAVIES, G. et al. Genome-wide association studies establish that human intelligence is highly heritable and polygenic. *Molecular Psychiatry*, v. 16, n. 10, p. 996-1005, 2011.

– PLOMIN, R.; DEARY, I. J. The new genetics of intelligence. *Nature Reviews Genetics*, v. 19, p. 148-159, 2018.

– HILL, W. D. et al. Genomic analysis of family data reveals additional genetic effects on intelligence and personality. *Molecular Psychiatry*, v. 23, p. 2347-2362, 2018.

– TRZASKOWSKI, M. et al. DNA evidence for strong genetic stability and increasing heritability of intelligence from age 7 to 12. *Molecular Psychiatry*, v. 19, p. 380-384, 2014.

– VINKHUYZEN, A. A. E. et al. Reconsidering the heritability of intelligence in adulthood: taking assortative mating and cultural transmission into account. *Behavior Genetics*, v. 42, p. 187-198, 2012.

– JANSEN, P. R. et al. GWAS of brain volume on 54,407 individuals and cross-trait analysis with intelligence identifies shared genomic loci and genes. *bioRxiv*, 2019.

Alguns destaques

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