Os xingamentos na Síndrome de Tourette: Reflexo do que muitos pensam, mas não dizem?

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Pesquisador(a):  

Dr Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues

Sobre o autor do estudo: Dr. Fabiano de Abreu Agrela é Pós PhD em Neurociências e biólogo membro das principais sociedades científicas como SFN – Society for Neuroscience nos Estados Unidos, Sigma XI, sociedade científica onde os membros precisam ser convidados e que conta com mais de 200 prémios Nobel e a RSB – Royal Society of Biology, maior sociedade de biologia sediada no Reino Unido. É membro de 10 sociedades de alto QI, entre elas a Mensa, Intertel, ISPE, Triple Nine Society, coordenador Intertel Brazil, diretor internacional da IIS Society e presidente da ISI e ePiq society, todas sociedades restritas para pessoas com alto QI comprovados em testes supervisionados. Criou o primeiro relatório genético que estima a pontuação de QI através de teste de DNA e o projeto GIP – Genetic Intelligence Project com estudos genéticos e psicológicos sobre alto QI com voluntários. Autor de mais de 50 estudos sobre inteligência, foi voluntário em testes de QI supervisionados, testes genéticos de inteligência e estudo de neuroimagem já que atingiu a pontuação máxima em mais de um teste de QI em mais de um país corroborando com os demais resultados genéticos e de neuroimagem.

A Síndrome de Tourette (ST) é uma condição neurológica caracterizada por tiques motores e vocais involuntários. Entre esses tiques, destaca-se a coprolalia, que consiste na vocalização de palavras obscenas ou socialmente inadequadas. Apesar de rara, afetando menos de 20% dos pacientes com Tourette, a coprolalia desperta grande curiosidade e questionamentos. Este artigo explora a hipótese de que esses xingamentos podem refletir impulsos internos que, em outras circunstâncias, seriam reprimidos.

Por que o Tourette xinga?

A coprolalia é resultado da desinibição de circuitos cerebrais relacionados ao controle de impulsos. Estudos de neuroimagem apontam alterações em regiões específicas do cérebro, como os gânglios da base, o córtex pré-frontal e o sistema límbico, que afetam a habilidade de suprimir respostas comportamentais inadequadas. Essa disfunção é intensificada pela hiperatividade dopaminérgica, o que reduz a inibição natural de impulsos agressivos ou socialmente inadequados (Braun et al., 1995; Paschou et al., 2013).

Quais casos envolvem xingamentos?

Estudos indicam que a prevalência da coprolalia varia entre 4% e 60%, dependendo da gravidade dos casos, da população avaliada e de fatores culturais. Essa manifestação tende a ser mais frequente em pacientes com tiques severos e comorbidades como transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) (Jankovic e Kurlan, 2011; Müller‐Vahl, 2012).

Por que xingam?

A coprolalia surge como um reflexo do comprometimento do circuito córtico-estriato-talâmico-cortical, que regula o controle de impulsos e a modulação comportamental. Esse circuito é fortemente influenciado pela dopamina, e sua desregulação pode levar à expressão involuntária de palavras ou frases inadequadas. Além disso, o córtex orbitofrontal e o sistema límbico, que processam emoções, contribuem para a escolha de palavras carregadas emocionalmente (Singer, 1997; Steeves et al., 2010).

Por que temos pensamentos de ódio?

Pensamentos negativos ou de ódio fazem parte da condição humana e surgem como respostas emocionais a frustrações, conflitos ou ameaças percebidas. Essas reações estão associadas à atividade do sistema límbico, especialmente a amígdala, que regula respostas emocionais intensas. O córtex pré-frontal exerce um papel fundamental ao inibir a expressão desses pensamentos, ajudando a manter o controle social (Vicario e Martino, 2018).

Por que xingamos pessoas por dentro, mesmo sem motivo?

Em muitas situações, julgamentos automáticos ou preconceitos inconscientes podem desencadear pensamentos negativos. Mesmo sem razões objetivas, esses pensamentos podem ser provocados por associações emocionais ou experiências passadas, processadas no sistema límbico. Normalmente, o córtex pré-frontal inibe essas reações, impedindo que se manifestem de forma explícita (Braun et al., 1995; Singer, 1997).

O que traz o controle?

O controle de impulsos depende da interação entre o córtex pré-frontal e as regiões subcorticais, como os gânglios da base. Neurotransmissores como dopamina, GABA e serotonina desempenham papéis cruciais na modulação desses circuitos. A dopamina regula os processos de recompensa e motivação, enquanto o GABA atua como um inibidor, suprimindo respostas impulsivas. A serotonina, por sua vez, modula o humor e a capacidade de lidar com estímulos emocionais (Paschou et al., 2013; Steeves et al., 2010).

Por que Tourette não controla?

Pacientes com Tourette apresentam disfunções no circuito córtico-estriatal e no córtex pré-frontal, reduzindo a capacidade de suprimir impulsos. Além disso, a hiperatividade dopaminérgica e a conexão alterada com o sistema límbico intensificam os tiques e tornam difícil o controle voluntário sobre as vocalizações (Gunduz e Okun, 2016).

Sub-regiões do córtex pré-frontal

O córtex pré-frontal é dividido em várias sub-regiões, cada uma com funções específicas relacionadas ao controle comportamental:
• Córtex dorsolateral pré-frontal (DLPFC): Responsável pelo planejamento executivo e pela supressão de comportamentos inadequados.
• Córtex orbitofrontal (OFC): Envolvido na regulação emocional e na tomada de decisões sociais.
• Córtex ventromedial pré-frontal (vmPFC): Relacionado ao processamento emocional e à avaliação de riscos e recompensas.
• Córtex anterior cingulado (ACC): Ativo na detecção de erros e no ajuste de comportamentos (Vicario e Martino, 2018; Braun et al., 1995).

Neurotransmissores envolvidos

• Dopamina: Principal neurotransmissor associado ao controle motor e à expressão de tiques.
• GABA: Atua como um inibidor, suprimindo respostas neuronais excessivas.
• Serotonina: Modula a regulação emocional e o humor.

Genes e mutações

Embora a base genética da ST seja complexa, estudos apontam para a influência de múltiplos genes que regulam os sistemas dopaminérgico e serotoninérgico. Mutuações raras e fatores poligênicos contribuem para a heterogeneidade dos sintomas. Além disso, estudos recentes sugerem o papel da histamina no desenvolvimento da síndrome, o que pode abrir novas perspectivas terapêuticas (Deng et al., 2012; Paschou et al., 2013).

Conclusão

Os xingamentos associados à coprolalia na Síndrome de Tourette levantam questões importantes sobre os limites entre os impulsos humanos e o controle voluntário. A coprolalia não é uma manifestação consciente, mas sim o resultado de disfunções em circuitos neurais que regulam os impulsos e o comportamento. A hipótese de que esses xingamentos podem refletir pensamentos reprimidos encontra suporte nos estudos que destacam o papel do sistema límbico e do córtex pré-frontal no processamento emocional e na supressão de impulsos.

A compreensão mais profunda das bases neuroanatômicas, neuroquímicas e genéticas da Síndrome de Tourette oferece não apenas insights sobre a condição, mas também novas possibilidades de intervenções terapêuticas. Além disso, ao desmistificar a coprolalia e outras manifestações da síndrome, podemos promover uma maior aceitação social e oferecer suporte adequado aos pacientes.

Referências

• BRAUN, A. R. et al. The functional neuroanatomy of Tourette’s syndrome: an FDG-PET study. Neuropsychopharmacology, v. 13, p. 151-168, 1995.
• DENG, H.; GAO, K.; JANKOVIC, J. The genetics of Tourette syndrome. Nature Reviews Neurology, v. 8, p. 203-213, 2012.
• GUNDUZ, A.; OKUN, M. S. A review and update on Tourette syndrome: where is the field headed? Current Neurology and Neuroscience Reports, v. 16, p. 1-13, 2016.
• JANKOVIC, J.; KURLAN, R. Tourette syndrome: evolving concepts. Movement Disorders, v. 26, 2011.
• MÜLLER‐VAHL, K. Monolingual coprolalia in bilingual patients with Tourette syndrome. Movement Disorders, v. 27, 2012.
• PASCHOU, P. et al. Genetic susceptibility and neurotransmitters in Tourette syndrome. International Review of Neurobiology, v. 112, p. 155-177, 2013.
• SINGER, H. S. Tourette syndrome. Coprolalia and other coprophenomena. Neurologic Clinics, v. 15, n. 2, p. 299-308, 1997.
• STEEVES, T. et al. Extrastriatal dopaminergic dysfunction in Tourette syndrome. Annals of Neurology, v. 67, 2010.
• VICARIO, C.; MARTINO, D. Social communication in Tourette syndrome: a glimpse at the contribution of the insula and the prefrontal cortex. Brain: a Journal of Neurology, v. 141, p. e58, 2018.

ISSN: 2763-6895

Prefixo DOI: 10.56238/cpahciencia

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