Risco Poligênico e a Trajetória da Sintomatologia Depressiva na Adolescência

A adolescência é um período crítico para o início da depressão, sendo a influência genética um fator estabelecido na sua etiologia, conforme demonstram estudos com gêmeos. Recentes avanços nos estudos de associação genômica ampla (GWAS) identificaram inúmeras variantes genéticas comuns (polimorfismos de nucleotídeo único, ou SNPs) que, quando combinadas em um Escore de Risco Poligênico (PRS), podem quantificar a vulnerabilidade genética para transtornos psiquiátricos. Contudo, o papel do PRS na depressão adolescente e nas alterações longitudinais dos sintomas ainda carecia de investigação aprofundada.

O estudo “Polygenic risk for depression, anxiety and neuroticism are associated with the severity and rate of change in depressive symptoms across adolescence” (Kwong et al., 2021) examinou a associação entre o PRS para cinco traços psiquiátricos e a sintomatologia depressiva, medida longitudinalmente durante a adolescência.

Associações Genéticas com Sintomas Depressivos

O estudo demonstrou que o risco poligênico para depressão, ansiedade e neuroticismo está significativamente associado aos sintomas depressivos na adolescência.

Severidade dos Sintomas: O PRS para depressão foi o que demonstrou a associação mais forte com a severidade dos sintomas depressivos. Além disso, o PRS para neuroticismo e ansiedade também foram associados a uma maior severidade dos sintomas depressivos.

Trajetória Longitudinal: O PRS para depressão, ansiedade e neuroticismo também se associaram a uma taxa de mudança significativamente diferente nos sintomas depressivos ao longo do tempo.

Um PRS mais alto para depressão foi associado a um aumento nos sintomas depressivos ao longo da adolescência.

O PRS para ansiedade e neuroticismo também apresentou associação com o aumento dos sintomas.

Implicações Clínicas e Interdisciplinares

A relevância das descobertas reside na sua aplicabilidade ao modelo de diátese-estresse, sugerindo que o risco poligênico pode representar uma diátese (vulnerabilidade genética) para o desenvolvimento da depressão. A associação do PRS de neuroticismo com os sintomas depressivos é particularmente relevante, dada a alta correlação genética entre neuroticismo e depressão. O neuroticismo, um traço de personalidade caracterizado por instabilidade emocional e tendência à experiência de afeto negativo, atua como um potente fator de risco para a depressão.

Os resultados destacam a importância de considerar o risco genético ao investigar o desenvolvimento de psicopatologia na adolescência. A detecção precoce de indivíduos com alto risco poligênico poderia permitir a implementação de intervenções preventivas focadas, visando modular a trajetória de aumento dos sintomas depressivos durante este período de desenvolvimento.

É crucial notar que o PRS para esquizofrenia e transtorno bipolar não apresentou associação com os sintomas depressivos na adolescência, sugerindo uma especificidade na partilha de risco genético entre a depressão, a ansiedade e o neuroticismo. Estudos futuros devem se concentrar em combinar o PRS com outros fatores de risco (ambientais e psicossociais) para melhorar a precisão preditiva e a eficácia das intervenções.

Referência:

KWONG, Alex S. F. et al. Polygenic risk for depression, anxiety and neuroticism are associated with the severity and rate of change in depressive symptoms across adolescence. Journal of Child Psychology and Psychiatry, Hoboken, v. 62, n. 12, p. 1462-1474, Dec. 2021. DOI: 10.1111/jcpp.13422.

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