A depressão é um fenômeno psicopatológico complexo, cujas manifestações em adolescentes, mesmo em níveis subclínicos ou moderados, estão associadas a desfechos de má adaptação. Para otimizar a detecção e a intervenção, é crucial identificar quais sintomas são mais centrais ou influentes na rede sintomática do Transtorno Depressivo Maior (TDM) nesta faixa etária.
Análise de Redes e a Centralidade dos Sintomas
Um estudo que utilizou a Análise de Redes (Network Analysis) – uma metodologia que trata os sintomas como nós (nodes) e as associações entre eles como arestas (edges) – em uma amostra comunitária diversa de adolescentes (13 a 19 anos), avaliada pelo Children’s Depression Inventory (CDI), buscou identificar os sintomas mais centrais para o TDM adolescente.
Os resultados revelaram uma estrutura de rede que enfatiza a centralidade dos sintomas cognitivos e afetivos negativos, em contraste com os sintomas somáticos ou comportamentais.
Sintomas Mais Centrais: Os quatro sintomas identificados como os mais centrais na rede de depressão adolescente foram:
Auto-ódio (Self-hatred): Sentimentos de aversão e desvalorização intensa de si mesmo.
Solidão (Loneliness): A percepção de isolamento e falta de conexão social.
Tristeza (Sadness): Humor deprimido persistente.
Pessimismo (Pessimism): Uma visão negativa e desesperançosa do futuro.
Estes sintomas centrais demonstram ser os mais fortemente conectados aos demais sintomas da rede. A alta centralidade de um sintoma sugere que sua ativação (presença ou intensidade) tem o maior potencial para ativar outros sintomas, desencadeando e sustentando o ciclo depressivo.
Associações Sintomáticas e Implicações para o Tratamento
A análise também identificou as associações (edges) mais fortes entre os sintomas, fornecendo insights sobre a forma como a sintomatologia se manifesta e se propaga na rede:
Auto-ódio mostrou uma forte associação com culpa (guilt).
Solidão estava mais fortemente ligada a isolamento social (social withdrawal).
Tristeza apresentou uma forte conexão com o choro (crying).
A alta centralidade do auto-ódio e da solidão é particularmente notável, sugerindo que as intervenções terapêuticas focadas na regulação emocional e nas habilidades sociais podem ter um efeito de propagação (leverage) mais significativo na sintomatologia geral do que focar em sintomas periféricos. Por exemplo, a redução do auto-ódio pode interromper a progressão para a culpa, enquanto a diminuição da solidão pode mitigar o isolamento social.
Comparação por Gênero
O estudo avaliou potenciais diferenças na estrutura e conectividade da rede de sintomas depressivos entre meninos e meninas. Os resultados indicaram que não houve diferenças significativas na estrutura geral da rede nem na conectividade entre os grupos de gênero. Isso sugere que os mecanismos subjacentes à sintomatologia depressiva, em termos de quais sintomas se influenciam mutuamente, são amplamente semelhantes em adolescentes do sexo masculino e feminino.
Conclusão
A utilização da Análise de Redes destaca a importância da Auto-ódio, Solidão, Tristeza e Pessimismo como os pilares centrais da manifestação do TDM em adolescentes. Clinicamente, estas descobertas sugerem um imperativo para que as intervenções de psicoterapia, como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), priorizem alvos terapêuticos que visem diretamente a redução destes estados cognitivos e afetivos negativos centrais, a fim de desestabilizar a rede sintomática e promover a remissão do quadro depressivo.
Referência:
MULLARKEY, Michael C.; MARCHETTI, Igor; BEEVERS, Christopher G. Using Network Analysis to Identify Central Symptoms of Adolescent Depression. Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, v. 48, n. 4, p. 656-668, 2019.