O Imperativo do Diagnóstico Diferencial Precoce entre Transtorno Bipolar e Transtorno Depressivo Maior em Adolescentes

Os transtornos de humor são altamente prevalentes na adolescência, englobando principalmente o Transtorno Bipolar (BD) e o Transtorno Depressivo Maior (MDD). A sobreposição de sintomas depressivos entre estas duas condições representa um desafio significativo para o diagnóstico diferencial rápido e preciso na prática clínica. A maior parte dos pacientes com BD apresenta um episódio depressivo como primeiro sintoma , e a depressão é predominante no curso subsequente da doença , o que contribui para que cerca de 50-75% dos pacientes com BD sejam inicialmente diagnosticados erroneamente como MDD.

Consequências da Má-Conduta Diagnóstica

O diagnóstico incorreto de BD como MDD pode levar a um tratamento inadequado. Embora os antidepressivos sejam o tratamento de primeira linha para episódios depressivos , em pacientes com depressão bipolar, o uso desses medicamentos acarreta um risco considerável de induzir episódios de mania ou hipomania. Além disso, pode aumentar o risco de comportamento suicida e causar a cronicidade do curso do BD, especialmente em adolescentes. Essas consequências podem resultar em um prognóstico clínico e funcional pior , reforçando a necessidade vital de distinguir com precisão o BD do MDD em adolescentes.

Marcadores Clínicos e Biológicos de Diferenciação

O estudo bibliométrico e visual “Differentiation between bipolar disorder and major depressive disorder in adolescents: from clinical to biological biomarkers” (Yang et al., 2023) identificou que as características clínicas, os fatores genéticos e a neuroimagem são os atuais focos de pesquisa para a diferenciação diagnóstica.

1. Características Clínicas

Embora a psicopatologia continue sendo a principal evidência para o diagnóstico , o BD apresenta maior probabilidade de exibir certos traços distintivos em comparação com o MDD:

Comorbidades Psiquiátricas: O BD está associado a mais comorbidades, como transtorno de conduta, transtorno obsessivo-compulsivo e abuso de substâncias.

Sintomas Maníacos Subsindrômicos: Pacientes com depressão bipolar apresentaram sintomas maníacos mais graves e pontuações mais altas em questionários como o Hypomania Checklist-32 do que aqueles com depressão unipolar.

Aparência Atypical: Sinais como aumento do apetite ou do sono, retardo psicomotor e reatividade do humor são considerados potenciais marcadores. No entanto, nem todos os sintomas atípicos são úteis na identificação.

Risco de Suicídio e Autoagressão: Taxas mais elevadas de suicídio e atos de autoagressão não suicida foram observadas em sujeitos com depressão bipolar.

História Familiar Positiva: Uma taxa alta de história familiar positiva para doenças psiquiátricas é mais distintiva no BD.

2. Fatores Genéticos

O BD demonstra maior hereditariedade e vulnerabilidade genética (60-80%) do que o transtorno depressivo (30-50%). O Escore de Risco Poligênico (PRS) para BD pode diferenciar o BD do MDD , sugerindo que pode ser uma ferramenta de diagnóstico complementar nos estágios iniciais, quando a informação clínica é incerta. Além disso, os níveis de expressão do gene BDNF (brain-derived neurotrophic factor) foram menores no BD e os segundos menores no MDD em comparação com controles saudáveis, sugerindo-o como um biomarcador genético para estudo.

3. Neuroimagem

A investigação de características de neuroimagem tem progredido, com destaque para o Córtex Cingulado Anterior (ACC). Pacientes com BD demonstraram diferenças específicas no ACC em comparação com MDD, incluindo:

Conectividade Funcional (FC): A depressão bipolar mostrou um aumento na FC inter-hemisférica entre áreas frontais.

Volume: O lado direito da matéria branca do ACC foi menor na depressão unipolar do que na bipolar.

Metabolismo: A depressão unipolar demonstrou uma razão colina/creatina significativamente aumentada no ACC em comparação com a bipolar.

Atividade em Tarefas: Adolescentes com depressão bipolar foram diferenciados por uma menor atividade neural no ACC e outras áreas cerebrais durante experimentos com estímulos emocionais.

4. Biomarcadores em Sangue Periférico

Biomarcadores obtidos do sangue periférico, sendo acessíveis e econômicos, também são áreas de interesse. Estudos sugerem que:

Citocinas Inflamatórias: Pacientes com BD exibiram níveis mais altos de citocinas pró-inflamatórias e mais baixos de citocinas anti-inflamatórias.

Marcadores Metabólicos: Pacientes com BD apresentaram níveis mais elevados de glicose em jejum, ácido úrico e lactato desidrogenase (LDH) em comparação com MDD, o que pode refletir um distúrbio metabólico e disfunção mitocondrial no BD.

Direções Futuras

Apesar dos avanços, a literatura que compara diretamente BD e MDD em adolescentes ainda é limitada e com amostras pequenas, necessitando de confirmação em estudos mais amplos. O futuro da pesquisa deve se concentrar na expansão dos estudos de biomarcadores objetivos , na exploração de novas direções como a eletroencefalografia (EEG), que oferece boa resolução temporal para mudanças dinâmicas no cérebro , e na aplicação de tecnologias de sequenciamento de alto rendimento (multi-ômicas, como a transcriptômica e a metabolômica) para aprofundar a busca por biomarcadores em sangue periférico. A construção de modelos de diagnóstico diferencial multidimensional usando aprendizado de máquina também se apresenta como uma promessa para aplicações clínicas.

Referência:

YANG, Ruilan et al. Differentiation between bipolar disorder and major depressive disorder in adolescents: from clinical to biological biomarkers. Frontiers in Human Neuroscience, Lausanne, v. 17, p. 1-16, 15 Sept. 2023. DOI: 10.3389/fnhum.2023.1192544.

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