A relação entre inteligência e cognição tem sido um tópico de intenso debate e pesquisa no campo das neurociências. Embora frequentemente usadas de forma intercambiável, essas duas capacidades mentais possuem distinções cruciais. A inteligência refere-se à capacidade geral de compreender e resolver problemas, envolvendo a habilidade de pensar abstratamente, adaptar-se a novas situações, aprender com a experiência e utilizar recursos cognitivos de forma eficaz. Por outro lado, a cognição abrange todos os processos mentais e atividades relacionadas à aquisição, processamento, armazenamento e uso de informações, incluindo percepção, atenção, memória, linguagem, raciocínio, solução de problemas e tomada de decisões. A complexidade e multifacetas da cognição são enfatizadas pela perspectiva “4E” (Embodied, Embedded, Enactive, Extended), que destaca a importância do corpo, do ambiente, da ação e de artefatos externos como parte integrante dos processos cognitivos, afastando a noção de que a cognição é exclusivamente um produto do cérebro isolado.
Pesquisas indicam que indivíduos com alto Quociente de Inteligência (QI), uma medida numérica que avalia a capacidade cognitiva geral , podem apresentar baixa capacidade cognitiva em áreas específicas. Uma teoria proposta para explicar tais discrepâncias é a da inteligência limítrofe à doença cognitiva, que sugere que a inteligência em pessoas de alto QI pode atingir um “ponto limite” onde, se ultrapassado, pode resultar em problemas cognitivos. Um exemplo notável que ilustra essa complexa relação é o caso de Adolf Hitler, que, apesar de possuir um QI de 141 e uma grande visão estratégica, apresentava um transtorno de personalidade narcisista com notável falta de empatia, o que interferia em sua capacidade intelectual e raciocínio lógico. Isso sugere uma possível disfunção no córtex pré-frontal ventromedial e suas conexões, uma região cerebral essencial para o controle de condutas sociais e o uso de sinais emocionais no comportamento.
Estudos têm revelado que pessoas com alto QI podem ter alta predisposição genética para condições como autismo e bipolaridade, enquanto exibem baixa predisposição para Alzheimer e, potencialmente, alta predisposição para esquizofrenia. No entanto, a inteligência em si pode atuar como um mecanismo de “manobra” ou regulação, possivelmente impedindo o desenvolvimento de transtornos como esquizofrenia ou Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Apesar disso, pesquisas demonstram que adultos com TDAH e alto QI podem ter desempenho inferior em testes de funcionamento executivo em comparação com indivíduos de alto QI sem TDAH.
A neuroplasticidade cerebral, a capacidade do cérebro de se adaptar e mudar em resposta à experiência e ao aprendizado, desempenha um papel fundamental no desenvolvimento cognitivo. Desafios e atividades cognitivamente exigentes são cruciais para promover essa plasticidade. A inteligência, especialmente a lógica associada ao córtex pré-frontal, serve como precursora para o desenvolvimento cognitivo. Embora o QI possa desenvolver a cognição, fatores ambientais como educação, alimentação e cultura, bem como predisposições genéticas para transtornos, podem influenciar o comportamento e, consequentemente, a cognição. A interpretação da inteligência em relação à cognição é essencial, pois o QI pode ser um indicador do potencial para desenvolver a cognição, mas a manifestação dessa capacidade é influenciada por uma variedade de fatores interconectados.
A teoria da inteligência limítrofe à doença cognitiva ressalta a complexidade das interações entre inteligência e cognição, apontando para a necessidade de mais estudos investigativos para comprovar a ligação direta e as nuances dessa relação. A compreensão aprofundada desses mecanismos pode levar a intervenções mais eficazes para indivíduos que apresentam discrepâncias entre suas habilidades intelectuais e cognitivas.
Referência:
RODRIGUES, F. A. A. Cognição e inteligência: a teoria sobre a inteligência limítrofe à doença cognitiva. I+D Internacional – Revista Cientifica y Académica, v. 4, n. 1, p. 104-119, jan./jun. 2025.

