Anormalidades Corticais no Transtorno Depressivo Maior (TDM): Uma Análise Global da ENIGMA

O Transtorno Depressivo Maior (TDM) é o distúrbio psiquiátrico mais prevalente, afetando anualmente aproximadamente 350 milhões de pessoas. Contudo, os substratos neuroanatômicos e a patogênese do TDM permanecem incompletamente elucidados. O ENIGMA Major Depressive Disorder Working Group conduziu a maior meta-análise mundial sobre alterações estruturais corticais no TDM, analisando exames de ressonância magnética (RM) estrutural T1-ponderada de 2148 pacientes com TDM e 7957 controles saudáveis em 20 centros internacionais, com o objetivo de identificar anormalidades cerebrais consistentes.

Alterações Corticais em Adultos com TDM

A análise em adultos (indivíduos com idade superior a 21 anos) revelou um afinamento cortical significativo e consistente em regiões dos lobos frontal e temporal em comparação com os controles saudáveis. O afinamento foi notavelmente observado nas seguintes regiões:

Córtex orbitofrontal medial (COF medial), de forma bilateral. Esta região apresentou os maiores tamanhos de efeito entre todas as regiões examinadas e está envolvida no aprendizado por reforço, na resposta ao medo e no controle adaptativo das emoções, funções que estão prejudicadas no TDM.

Córtex cingulado rostral anterior e posterior.

Ínsula e Giro fusiforme, bilateralmente.

Giro temporal médio esquerdo e Giro temporal inferior direito.

Córtex cingulado caudal anterior direito.

Estas regiões são caracterizadas por sua estreita interação com o sistema límbico, um achado que se alinha com o modelo fisiopatológico de TDM que postula circuitos límbico-corticais disfuncionais.

A análise estratificada em adultos mostrou que os efeitos de afinamento cortical foram mais evidentes em pacientes com primeiro episódio e naqueles com início da doença na idade adulta (idade > 21 anos). Em pacientes com início da doença na idade adulta, foi observado afinamento cortical em numerosas regiões frontais, cinguladas e temporais. Os pacientes com primeiro episódio de TDM apresentaram um afinamento mais disseminado em diversas regiões, com foco no COF medial/Córtex Cingulado Anterior (CCA) e na ínsula. Em contraste com a espessura, não foram detectadas diferenças significativas na área de superfície cortical em adultos com TDM, nem correlações robustas entre a espessura cortical e a gravidade dos sintomas (medidos pelo HDRS-17 e BDI-II) no momento da varredura.

Alterações Corticais em Adolescentes com TDM

Em contraste com os adultos, os adolescentes com TDM apresentaram menor área de superfície total do hemisfério esquerdo e direito, mas nenhuma diferença detectável na espessura cortical.

As reduções regionais na área de superfície em adolescentes deprimidos foram observadas em:

Giro lingual e Giro pericalcarino, bilateralmente.

Córtex occipital lateral esquerdo.

COF medial esquerdo.

Giro pré-central esquerdo.

Córtex parietal inferior direito.

Giro frontal superior direito.

Giro pós-central direito.

Esses déficits de área de superfície foram mais notáveis em pacientes adolescentes com episódio recorrente. A menor área de superfície no TDM adolescente pode ser um indício de maturação cortical atrasada, especificamente um atraso na expansão cortical que normalmente ocorre até cerca dos 12 anos de idade. Algumas regiões com anormalidades de área de superfície, como o COF medial e o Giro frontal superior, amadurecem ao longo de um período mais extenso durante a adolescência. Embora os déficits de área de superfície não fossem evidentes em pacientes adultos com TDM de início precoce, o que poderia indicar uma normalização com a transição para a idade adulta, foram observadas associações negativas fracas entre a gravidade dos sintomas depressivos (BDI-II) e a área de superfície de certas regiões nos adultos.

Implicações e Conclusão

Os resultados globais indicam que a estrutura cortical é anormal em diversas regiões cerebrais tanto em adultos quanto em adolescentes com TDM. O COF medial é consistentemente implicado em todas as análises em adultos, adolescentes e correlações clínicas, reforçando seu papel proeminente hipotetizado na depressão ao longo da vida.

A diferença nos achados (afinamento cortical em adultos versus déficits na área de superfície em adolescentes) sugere que o TDM pode impactar a estrutura cerebral de maneira altamente dinâmica, com padrões de alterações distintos em diferentes fases da vida. As medidas de espessura cortical e área de superfície representam características morfométricas distintas do córtex, que podem ser afetadas de forma diferente pela depressão em várias fases da vida.

Estudos longitudinais futuros são essenciais para investigar essas mudanças dinâmicas nas regiões corticais e correlacioná-las com perfis de sintomas, desfechos e respostas ao tratamento no TDM.

Referência:

Schmaal L, Hibar DP, Sämann PG, Hall GB, Baune BT, Jahanshad N, et al. Cortical abnormalities in adults and adolescents with major depression based on brain scans from 20 cohorts worldwide in the ENIGMA Major Depressive Disorder Working Group. Mol Psychiatry. 2017;22(6):900-909.

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