A Personalidade no Desempenho Acadêmico: Uma Análise Além da Inteligência

A relação entre personalidade e desempenho acadêmico tem sido um tópico de pesquisa há mais de um século, mas as conclusões foram historicamente inconsistentes devido à falta de uma estrutura teórica unificada e problemas metodológicos. No entanto, a adoção do Modelo dos Cinco Fatores (FFM), juntamente com o avanço de técnicas meta-analíticas, permitiu uma revisão estatística abrangente que revela a importância da personalidade como um preditor significativo do sucesso acadêmico. Este artigo de opinião, baseado em uma meta-análise de mais de 70.000 participantes, argumenta que a personalidade, em particular a Conscienciosidade, deve ser seriamente considerada em futuras teorias e práticas educacionais, e não apenas como um complemento à inteligência.

A meta-análise demonstrou que a Conscienciosidade se correlaciona com o desempenho acadêmico em um nível estatisticamente e praticamente significativo. Este fator, que reflete a confiabilidade e a vontade de alcançar objetivos, está associado ao esforço sustentado, à definição de metas e ao gerenciamento de tempo, todos essenciais para o sucesso acadêmico. A força da correlação da Conscienciosidade com o desempenho acadêmico foi de magnitude semelhante à da inteligência, um achado notável, visto que os testes de personalidade não foram projetados especificamente para prever o sucesso na escola, ao contrário dos testes de inteligência. A pesquisa refuta a ideia de que a relação entre personalidade e desempenho acadêmico se deve principalmente a uma ligação comum com a inteligência.

Outros traços do FFM também mostraram correlações significativas com o desempenho acadêmico:

 A Agradabilidade foi positivamente associada à cooperação com os processos de aprendizagem.

A Abertura à Experiência (Openness) correlacionou-se positivamente com a abordagem do aprendizado, a motivação e o pensamento crítico.

A Estabilidade Emocional mostrou uma correlação positiva, indicando que a ansiedade e o foco nas emoções podem prejudicar o desempenho em tarefas acadêmicas.

A Extroversão teve uma correlação negativa, possivelmente porque os alunos mais extrovertidos tendem a socializar mais e estudar menos.

As análises de moderação revelaram que o nível educacional (primário, secundário ou terciário) e a idade são fatores importantes que afetam a força dessas correlações. As correlações com todos os fatores, exceto a Conscienciosidade, diminuíram à medida que os alunos avançavam nos níveis de ensino. A correlação da Conscienciosidade se manteve estável, sugerindo que sua importância na vida acadêmica pode, na verdade, aumentar com o tempo.

Em um nível prático, essas descobertas têm implicações importantes para a educação. A Conscienciosidade pode ser uma ferramenta valiosa para identificar alunos em risco de baixo desempenho, permitindo que programas de intervenção sejam direcionados a déficits relacionados à personalidade, como a falta de esforço e de definição de metas. Além disso, a descoberta de que a validade da Conscienciosidade se assemelha à da inteligência sugere que ela poderia ser usada como um critério de seleção para o ensino superior, embora a questão da validade da medição em contextos de alta pressão, como os testes de admissão, precise ser cuidadosamente avaliada.

Em conclusão, a personalidade, especialmente a Conscienciosidade, desempenha um papel fundamental no desempenho acadêmico. A compreensão de sua complexa interação com a inteligência, o nível de ensino e a idade é crucial para o desenvolvimento de teorias educacionais mais abrangentes e para a implementação de práticas pedagógicas que reconheçam a multiplicidade de fatores que contribuem para o sucesso do aluno.

Referência:

Poropat, A. E. (2009). A Meta-Analysis of the Five-Factor Model of Personality and Academic Performance. Psychological Bulletin, 135(2), 322–338. DOI: 10.1037/a0014996.

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