O 17β-estradiol (E2), além de ser um hormônio sexual essencial, desempenha papéis críticos no cérebro como neuromodulador, influenciando a plasticidade sináptica e a excitabilidade neural. O presente estudo explora os efeitos da inibição crônica da biossíntese cerebral de E2 por meio do letrozol, um inibidor da aromatase amplamente utilizado na terapia adjuvante do câncer de mama, em um modelo murino.
Contexto e Justificativa
Os inibidores de aromatase como o letrozol reduzem a produção de E2 nos tecidos periféricos e cerebrais. Embora eficazes na redução de recidivas de câncer de mama em mulheres com tumores positivos para receptores de estrogênio, tais tratamentos estão associados a potenciais efeitos colaterais cognitivos e afetivos. Este trabalho utiliza camundongos ovariectomizados para modelar os efeitos da supressão de E2 isoladamente, excluindo os confusores da doença e de outros tratamentos oncológicos.
Metodologia
Camundongos fêmeas ovariectomizados foram tratados com letrozol (1 mg/kg/dia) durante três semanas. A plasticidade sináptica foi avaliada por:
- Microscopia de dois fótons: Análise longitudinal da densidade e rotatividade de espinhas dendríticas em células piramidais do neocórtex.
- Eletrofisiologia: Medição de potenciação de longa duração (LTP) no córtex somatossensorial.
- Comportamento: Avaliação do desempenho em teste de reconhecimento de objetos.
Resultados Principais
- Dinâmica das Espinhas Dendríticas: A densidade de espinhas dendríticas em células piramidais da camada 5 neocortical permaneceu inalterada com o tratamento com letrozol. No entanto, houve uma redução na rotatividade das espinhas, indicando menor plasticidade estrutural.
- Plasticidade Funcional: A LTP nas sinapses da camada 4 à camada 2/3 foi significativamente reduzida nos camundongos tratados com letrozol, demonstrando déficits na plasticidade funcional.
- Desempenho Cognitivo: Apesar de apresentarem pior desempenho no teste de reconhecimento de objetos em comparação com controles intactos, os camundongos ovariectomizados tratados com letrozol tiveram um desempenho semelhante ao dos controles regulares, sugerindo um efeito inesperado do tratamento.
Discussão
Os resultados reforçam o papel do E2 derivado do cérebro na manutenção da plasticidade estrutural e funcional. A redução da LTP e da rotatividade das espinhas após a inibição da aromatase indica que o E2 modula ativamente as sinapses neocorticais. Surpreendentemente, o tratamento com letrozol resgatou déficits cognitivos em camundongos ovariectomizados, evidenciando a complexidade do impacto do E2 em diferentes aspectos do funcionamento cerebral.
Implicações
Embora os efeitos colaterais cognitivos dos inibidores de aromatase sejam frequentemente relatados, nossos achados destacam que o impacto do E2 no cérebro pode variar entre domínios estruturais, funcionais e comportamentais. Estudos futuros devem explorar como diferentes níveis de E2 influenciam a interação entre plasticidade neural e comportamento, com vistas ao desenvolvimento de intervenções que mitiguem efeitos adversos associados à terapia adjuvante.
Para mais detalhes, consulte o estudo completo: A inibição crônica da aromatase atenua a plasticidade sináptica em camundongos ovariectomizados | eNeuro