A expressão gênica desempenha um papel fundamental no desenvolvimento e na função do sistema nervoso. As interações entre os produtos da expressão gênica e o ambiente são cruciais para a resposta adaptativa do sistema nervoso. Variações na expressão gênica, mesmo pequenas, podem afetar significativamente a atividade do sistema. Mudanças em genes regulatórios durante o desenvolvimento podem aumentar a suscetibilidade a condições do neurodesenvolvimento como autismo, TDAH e esquizofrenia. Alterações na expressão gênica também estão implicadas em transtornos psiquiátricos como depressão e TOC, e nos aspectos de reforço do vício. Além disso, alterações persistentes na expressão gênica podem estar envolvidas no início e na manutenção de estados patológicos como convulsões e doenças neurodegenerativas como Parkinson e Alzheimer. No entanto, é essencial reconhecer que as associações entre doenças e produtos da expressão gênica não implicam determinismo genético. Embora muitas dessas doenças tenham uma base genética hereditária, geralmente na forma de genes de suscetibilidade, é a interação contínua entre os produtos da expressão gênica e o ambiente que molda a atividade do sistema nervoso. (Marcotte et al., 2003)
Microarrays de cDNA:
Os microarrays de cDNA permitem quantificar de forma rápida e precisa um grande número de alterações potenciais na expressão gênica simultaneamente. Essa técnica, baseada na hibridização de moléculas de DNA complementares, possibilita a análise em larga escala de genes expressos. Fragmentos de cDNA são dispostos em uma matriz de alta densidade, e a hibridização com amostras de tecido permite determinar os níveis de expressão de milhares de genes simultaneamente. Essa capacidade de examinar a expressão de inúmeros genes ao mesmo tempo abre caminho para a análise do estado de expressão de um indivíduo em um único experimento, especialmente com os avanços no sequenciamento genômico. (Marcotte et al., 2003)
Aplicações em Esquizofrenia:
A esquizofrenia é uma doença complexa com componentes genéticos, ambientais e de desenvolvimento, tornando-a ideal para análise de expressão gênica em larga escala com microarrays de cDNA. Estudos de microarrays em tecido cerebral post-mortem de pacientes com esquizofrenia têm identificado alterações na expressão de genes envolvidos na função pré-sináptica, neurotransmissão glutamatérgica e GABAérgica, e na regulação da sinalização da proteína G. Resultados consistentes apontam para uma redução na expressão de RGS4 no córtex pré-frontal de pacientes com esquizofrenia. Outros estudos têm destacado a expressão reduzida de genes relacionados à mielinização, levantando a possibilidade de que os oligodendrócitos sejam funcionalmente deficientes na esquizofrenia. (Marcotte et al., 2003)
Aplicações em Alzheimer:
A doença de Alzheimer (DA) é a forma mais prevalente de neurodegeneração relacionada ao envelhecimento. É uma doença progressiva que leva ao comprometimento cognitivo e é caracterizada por alterações neuropatológicas como placas amiloides extracelulares, emaranhados neurofibrilares intracelulares de proteína tau anormalmente fosforilada e degeneração dos neurônios colinérgicos do prosencéfalo basal. Estudos de microarrays em DA revelaram alterações significativas na expressão gênica em várias regiões do cérebro, incluindo o hipocampo, o córtex cingulado e a amígdala. (Marcotte et al., 2003)
Abordagens Proteômicas:
A proteômica, que se concentra na análise em larga escala de proteínas, complementa a genômica e os microarrays de cDNA. As proteínas, produtos finais da expressão gênica, são reguladas por outros constituintes celulares e sofrem modificações pós-traducionais que influenciam suas funções. A proteômica busca elucidar o papel da expressão proteica, incluindo interações proteína-proteína e formação de complexos proteicos. Avanços na espectrometria de massas e técnicas de isolamento de proteínas têm impulsionado as abordagens proteômicas, permitindo a identificação e análise de proteínas em misturas complexas. (Marcotte et al., 2003)
Proteômica em Alzheimer:
A DA, com suas placas amiloides extracelulares e emaranhados neurofibrilares intracelulares, é uma doença em que as interações proteína-proteína provavelmente desempenham um papel crucial. A análise proteômica em DA pode confirmar e complementar estudos genômicos, revelando alterações na expressão e modificações pós-traducionais de proteínas. Estudos proteômicos têm identificado proteínas diferencialmente expressas em várias regiões do cérebro na DA, incluindo proteínas relacionadas à resposta inflamatória, metabolismo energético, função sináptica e estresse oxidativo. (Marcotte et al., 2003)
Conclusões:
Os avanços em genômica e proteômica, incluindo microarrays de cDNA e espectrometria de massas, revolucionaram a pesquisa biomédica, especialmente na neurociência. A capacidade de analisar a expressão de milhares de genes e proteínas simultaneamente, combinada com a bioinformática, está fornecendo uma visão mais completa dos processos biológicos complexos e das doenças. Na neurociência, a aplicação da genômica e da proteômica é particularmente promissora, considerando a complexidade e a diversidade das interações celulares no sistema nervoso. O uso contínuo dessas técnicas em tecidos humanos post-mortem, modelos animais e sistemas de cultura celular permitirá uma melhor compreensão da fisiologia do sistema nervoso em condições normais e patológicas, facilitando a descoberta de potenciais alvos para medicamentos para doenças cerebrais. No entanto, é essencial lembrar que a interpretação dos dados genômicos e proteômicos requer uma análise cuidadosa e uma compreensão profunda dos processos biológicos envolvidos. (Marcotte et al., 2003)
Referência:
MARCOTE, E. R.; SRIVASTAVA, L. K.; QUIRION, R. cDNA microarray and proteomic approaches in the study of brain diseases: focus on schizophrenia and Alzheimer’s disease. Pharmacology & Therapeutics, v. 100, n. 1, p. 63–74, 2003.