Coluna de Dr. Fabiano de Abreu Agrela
Quando ocorrem incidentes trágicos como os atentados a escolas que têm acontecido recentemente, muitos começam a buscar diversas explicações, apontar culpados, criar vieses para tentar entender o que leva alguém a cometer um ato como esse, mas a verdade é que tudo se resume ao cérebro.
Há algum tempo que venho reforçando que a nossa sociedade está enfrentando um coletivo de transtorno narcisista, causado em grande medida pelas redes sociais e por toda a alteração das dinâmicas sociais. A racionalidade, a coerência e as noções de certo e errado são dois aspectos fundamentais para o autocontrole, mas elas são bastante afetadas por alguns fatores, em especial ligados à modernidade.
As redes sociais superestimulam o sistema de recompensa do cérebro, fazendo com que cada vez mais seja necessário um estímulo maior para uma maior satisfação, gerando uma conta que não fecha e que gera diversos transtornos, as mudanças abruptas da sociedade estão tornando o cérebro da humanidade disfuncional.
Nosso cérebro evoluiu de forma mais lenta que a tecnologia, usar esse tipo de plataforma em excesso afeta seriamente o equilíbrio do cérebro, ativando as regiões mais primitivas e “confundindo” as regiões mais novas, esse processo ocorre mais acentuadamente em crianças e adolescentes por ainda não terem as regiões frontais do cérebro totalmente desenvolvidas – elas só completam seu desenvolvimento até os 30 anos de idade a depender do indivíduo, o que as torna mais vulneráveis a esse tipo de disfunção e gera a necessidade de mais atenção ao uso de redes sociais.
As redes sociais geram por si só a necessidade de aparecer, seguir trends, alimentar stories, competir com número de curtidas, etc., existem diversos mecanismos que incentivam o narcisismo e que, muitas vezes, geram resultados catastróficos na saúde mental do indivíduo, fazendo-o ultrapassar os limites da razão para obter reconhecimento, para ele passa a não importar tanto pelo que será conhecido, o importante é ter atenção para si, muitas vezes como uma tentativa de amenizar a sensação de solidão, o que é exemplificado pelo aumento de casos derivados de ansiedade em jovens e crianças.
A necessidade de chamar a atenção advém do instinto reprodutor, onde a recompensa se dá ao ser notado para conquistar ao próximo ou ao grupo. Nosso organismo de forma semântica não sabe diferenciar e são sensações similares para circunstâncias parecidas.
Assim chegamos em outro ponto importante para entendermos os processos que estimulam esse tipo de ação, os neurônios-espelho, eles são estruturas presentes no nosso cérebro capaz de reproduzir ações que observamos, no entanto, seus efeitos podem ser especialmente suscetíveis a ações violentas, é o que indica um novo estudo feito por uma equipe de pesquisadores da Stanford Medicine. Neste tópico podemos colocar à discussão o momento social que se vive e a forma como este afeta a percepção dos mais novos. A sociedade está muito mais intolerante a certos comportamentos mas por outro lado obriga a um politicamente correto que desgasta e coloca muita gente em situações desconfortáveis. É necessário aceitar tudo para ser aceite.
Outro importante ponto a focar detêm-se com os neurônio-espelho, uma das descobertas mais importantes da neurociência. Estes estão relacionados com a visão e o movimento permitindo o aprendizado por imitação, já que é acionado quando é necessário observar ou reproduzir o comportamento de outros seres da mesma espécie. Estes neurónios condicionam-nos desde o nascimento uma vez que estão relacionados com questões de sobrevivência.
O estudo analisou o cérebro de camundongos e percebeu que os neurônios-espelho eram ativados em uma região cerebral conhecida como “centro de raiva” de forma bastante similar quando o camundongo estava brincando ou quando ele observava uma briga, o que indica que o cérebro não distingue totalmente o fazer do ver alguém fazer quando se trata de repetir ações, esse comportamento, conhecido como efeito contágio, aliado à infinita capacidade de propagação da internet pode gerar um motor de violência que sai do controle facilmente. Quando mais situações ocorrem mais facilmente serão reproduzidas.
Por isso, diante dos recentes acontecimentos, diversos veículos de imprensa optaram por não divulgar fotos, vídeos e muitas informações sobre os autores dos atentados para não gerar um efeito contágio que possa estimular outros ataques, mas o papel dos pais também é muito importante nesse processo, ao mediar o uso de redes sociais pelos filhos. No entanto é importante perceber os reais motivos.
Esses dois fatores, as disfunções narcisistas geradas pelas redes sociais e o efeito contágio gerado pela ação dos neurônios-espelho contribuem fortemente para reduzir a capacidade de distinguir o certo do errado, perder a racionalidade e focar em receber glória e reconhecimento, mesmo que para isso precise recorrer aos métodos que conheceu por exemplo de terceiros divulgados massivamente.
Prefixo DOI: 10.56238/cpahciencia-008